Desde que me mudei pra Curitiba, em março de 2011, não tenho televisão em casa. No início me senti uma revolucionária, depois uma excluída. Mas confesso que eu adoro e até sinto falta de ver esses reality shows babacas de gravidez na adolescência, dietas, plásticas, reformas e mudança no visual. Até porque, uma das coisas que eu mais gosto de fazer na vida é reclamar e ficar xingando o mau gosto alheio é tipo um hobby pra mim.
Vim passar uma semana na casa da mamãe e tenho ao meu dispor uma televisão gigante com uma gama de canais à cabo. Consigo passar um tempo consideravelmente grande assistindo bobagens mas eis que um programa realmente conseguiu me tocar: Your style in his hands (Dormindo com meu estilista).
O nome já é bem sugestivo, mas tentem imaginar a seguinte situação: uma mãe que trabalha em um hospital 10 horas por dia, tem dois filhos pequenos, uma casa enorme e um marido. Essa mulher que além de trabalhar e se preocupar com a sua própria saúde, entretenimento, com a educação dos filhos e com a família SUPOSTAMENTE precisa pensar um pouco mais no quanto o seu querido marido sente falta de vê-la usando babydoll transparente de oncinha. Afinal, o valor das relações mora aí, né. Aí algum inteligentão inventou o reality show mais escroto do mundo que funciona assim: a mulher sai de casa, o marido vai até o seu guarda roupas e separa todas as roupas, sapatos, acessórios e roupas íntimas que ele não quer mais ver em sua bela donzela e joga em um INCINERADOR DE ROUPAS (de verdade, é uma máquina como aquelas de escritório de picar papel feita para roupas). Aí ele vai SOZINHO comprar o armário dela do jeito que ele achar melhor. Algumas das chamadas do programa dizem inclusive "ela não tem nenhum controle do que vai vestir" e "o marido tem total liberdade para escolher como sua esposa deve se vestir".
Assistir a esse programa começou a me causar um desconforto tão grande que eu mal estou conseguindo articular meus pensamentos. Eu não sei o que merece mais atenção: a iniciativa de criar um programa que deixa a mulher numa posição tão vulnerável e suscetível aos desejos do homem ao ponto de deixar de ter voz em uma coisa tão básica quanto vestir-se; os casais acharem a ideia legal e quererem participar desse circo; um cara achar que a esposa não pode usar moletom ou ter uma calcinha grande porque não é suficientemente sexy pra vida real ou uma mulher achar que sua opinião, conforto, vontade, desejo sejam menos importantes do que a vontade do marido dela de ter uma mulher gostosa pra gringo ver.
Tentando não deixar essas observações preliminares me fazerem desligar a televisão continuo assistindo ao espetáculo de um indivíduo que joga fora todas as calcinhas de sua esposa e as substitui por 6 conjuntos de lingerie de enfiar na bunda, com renda, babados e cinta liga esquecendo-se de detalhes básicos do tipo: as mulheres passam 1/5 do mês menstruadas, por exemplo. Ou que talvez um fio dental não seja a opção mais confortável pra uma enfermeira ou que talvez a esposa dele ache feio ou desconfortável ou odioso, apenas (afinal, a bunda é dela, a boceta, mas quem decide o que vai ficar ali por cima é ELE). Aí esse mesmo marido acha por bem jogar todos os tênis que essa mulher usa no seu dia-a-dia corrido e os substitui por: 4 saltos de 15cm, 2 anabelas de 10cm e uma bota de cano altíssimo. Ótimas escolhas! Eu mesma só vou pro trabalho, pro mercado, pra faculdade e pro banheiro de salto agulha. Tá de parabéns!
Será que o que leva uma mulher que tem uma filha de 4 anos e um filho de 1 ano a andar de moletom é apenas uma vontade incontrolável de ficar menos atraente para o seu marido? CLARO! COM CERTEZA! Porque tudo o que as mulheres fazem na vida está condicionado aos desejos de seus belos maridos, não é mesmo, meninas?
Da limpeza inicial do armário da mulher que tinha basicamente calças jeans e calças de moletom, camisetas, tênis e casacos não sobrou nada. Mas o desejo incontrolável de seu lindo esposo em ter uma mulher atraente o fez comprar APENAS mini shorts, mini blusas, mini saias, mini vestidos, saltos, calcinhas fio dental etc etc etc.
Depois dessa folia toda, o marido vai torrar o resto do dinheiro com a apresentadora/estilista e terminam, ao fim do dia, gastando $7.500,00 em roupas que eles acham adequadas para uma mãe sexy do século XXI. E é isso. Em 2013 milhões de pessoas param para assistir a esse belo show escancarado de machismo em um nível mundial. Só pra finalizar esse pequeno desabafo, termino com um diálogo entre a apresentadora e o marido:
- Você quer que ela use meia fina?
- Sim.
- E quando ela vai usar meia fina, Luke?
- Quando ela estiver limpando a casa e cozinhando.
Sem mais.
Inacreditável. Quando li o nome achei que seria sobre aquele fofo que disse que, de saia curta, eu nunca encontraria um amor. Mas é tão pior, meu deus. Me estômago está embrulhado de imaginar. Além da enorme e estrondosa falta de respeito, consciência ecológica e social para que, né? Para que doar as roupas que não vão ser usadas se elas podem simplesmente queimar e gerar um pouco mais de poluição? Mas quem é capaz de criar um programa babaca desses passou tão longe de consciência que nem dá para discutir. Credo.
ResponderExcluirPosso ser bem honesta?
ResponderExcluirEu quero que essa dona moça, a esposa, se dane. Quero que trabalhe 10h/dia em salto agulha, limpe a casa de meia fina e faça mingau de aveia com a calcinha enfiada na bunda.
Alguém que se submete a algo do tipo, que decide por livre e espontânea vontade abrir mão de um direito elementar que é escolher a roupa que vai usar, merece se f**** com o machismo que ajuda a alimentar.
Se ela estivesse chorando pedindo ajuda para se livrar do marido agressor, eu seria a primeira a defende-la, mas é uma pata que acha lindo ser comandada por alguém, provavelmente ainda acha-se especial e diferente das demais mulheres por ter um marido preocupado com a sua aparência, então, dane-se. Sofra as consequências das suas escolhas.